quinta-feira, 14 de abril de 2011

FMI or not to FMI por José Diogo Quintela

Esta crónica de José Diogo Quintela foi publicada na Pública - a revista do Público - este fim de semana, dia 10 de Abril de 2011, mas foi escrita antes de José Sócrates pedir ajuda ao FMI. Vale a pena ler na mesma. E eu passo a transcrever.


"Toda a gente sabe que os homens não pedem indicações quando não sabem o caminho. E toda a gente passou a saber que os primeiros-ministros não pedem ajuda quando estão na bancarrota. Já se viu que, para este Governo, trata-se de um ponto de honra. Por paradoxal que isso possa parecer, já que se trata de políticos e de honra.

José Sócrates está a ver se passa a batata quente a Passos Coelho. Com uma nuance: enquanto espera, está a aquecê-la ainda mais. Talvez "batata quente" não seja a imagem mais adequada para explicar a situação. Não sei se nós, portugueses, a compreendemos bem. Não que tenhamos ficado mais estúpidos e deixado de perceber a expressão. A expressão é que já não quer dizer a mesma coisa. Com esta crise, "batata quente" já não é um problema que se quer passar a outro, é uma refeição cozinhada, e há que aproveitá-la. Nos dias que correm, uma fonte de hidratos de carbono não é uma dificuldade, é um luxo.

Confesso que me custa perceber porque é que Sócrates se recusa a pedir dinheiro ao FMI, mas não a mim. E a si, leitor. Há quem diga que é uma questão de orgulho: o nosso primeiro-ministro não quer dar parte fraca aos estrangeiros. Há quem diga que é pura casmurrice: tinha garantido que não era preciso e agora não quer admitir que se enganou. Eu acho que a justificação é mais prosaica: já lhe cortaram o telefone por falta de pagamento e não tem maneira de contactar o FMI. Se for este o caso, é possível que Sócrates esteja à espera do Verão, para aproveitar a época dos incêndios e pedir ajuda por sinais de fumo.

Sócrates não parece preocupar-se muito com o rating da República. E eu acho bem. Muito em breve o problema de Portugal vai deixar de ser o rating, e passar a ser o rateio. Nomeadamente, o rateio que os credores vão fazer do país, quando não conseguirmos pagar as dívidas. A grande preocupação já não vai ser o FMI, mas um seu anagrama: FIM. Quem diz que o espectro da falência não pode ser aligeirado com divertidos jogos de palavras?

Para ser honesto, devo admitir que partilho com José Sócrates este medo de perder a face em frente a estrangeiros. Aborreço-me com as críticas infundadas que pessoas de outras nacionalidades nos fazem. Por exemplo, esta semana houve um jornalista espanhol que comparou José Sócrates a um condutor que circula em sentido contrário na auto-estrada, enquanto se queixa de que os outros condutores é que estão mal. Irritou-me que, para um forasteiro mal informado, o nosso primeiro-ministro não passe de um maluquinho egocêntrico que anda enganado em contramão.

É tomar-nos por parvos, a nós que o elegemos. e não é verdade. José Sócrates não é um maluquinho egocêntrico que anda enganado em contramão. Ele anda em contramão de propósito. É uma artimanha para não pagar portagem. Maluquinho e egocêntrico sim, mas com um plano.

Nota: esta crónica foi escrita antes de José Sócrates inverter a marcha e pedir ajuda."

José Diogo Quintela, in Público

(Imagem retirada do site www.publico.pt)

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