terça-feira, 31 de maio de 2011

Portugal na Terra do Nunca

"Portugal é neste momento uma espécie de Terra do Nunca - estão a ver, o paraíso onde vivia o Peter Pan? Na Terra do Nunca as crianças não cresciam, o que as impedia de ter uma vida real, mas também lhes dava o benefício de não ter de levar uma vida daquelas duras, em que damos o litro, trabalhamos, temos dissabores, enfrentamos desafios...enfim, e obtemos algumas das compensações que fazem parte do crescimento.

É assim o Portugal em que hoje vivemos, em plena campanha eleitoral. Um lugar sem história. Nem para a frente, sem projectos nem futuro, que os tempos não estão para promessas. Nem para trás, sem referências ao destino que temos traçado num acordo assinado com a troika do FMI, BCE e União Europeia.

O lugar que tomámos nas negociações com a troika não ajudou nada a que tivéssemos de nós próprios uma visão mais adulta e crescidinha. Nada nos infantilizaria mais do que levarmos uma boa lição de como se governa a vida de um país. Que foi o que aconteceu, precisamente. As medidas anunciadas são todas remédios que já poderíamos ter tomado há muito, mas simplesmente não tivemos coragem. Ou não fosse, lá está, Portugal um país infantil, em que os eleitores não têm noção da realidade e do tratamento de que o país precisa, mesmo que doa e arda. Se juntarmos a este o facto de andarmos sempre em eleições, ou seja, de os governos serem praticamente obrigados a terem sempre medidas eleitoralistas, temos o mais negro dos cenários traçados. Ou o mais fantasioso.

Logo a seguir à troika, veio a campanha eleitoral, para mostrarmos ainda mais o nosso lado infantil. No meio do maior desafio que Portugal já teve na sua história recente - precisamente o de acertar definitivamente o passo com a Europa - esta campanha tinha tudo para ser diferente. Tinha de ser um debate de ideias, uma mudança de paradigma, um corte epistemológico com pensamentos e acções que levaram à nossa ruína no passado. Uma visão adulta do país e do seu futuro.,

Numa campanha destas, esperava-se verdade. Se não em relação ao que aconteceu, pelo menos em relação ao que poderá ser Portugal nos próximos anos. Mas não. Uns são liberais com medo de perder votos. Os outros são falsamente estatizantes, sabendo de antemão que esse não pode ser o caminho - como aliás, está escrito na carta de compromisso com o FMI e a UE - mas que esse caminho dá votos. Os outros são alienados e não mostram qualquer adesão à realidade.

Aí estamos nós, na Terra do Nunca. Numa campanha como se fosse um conto infantil, maniqueísta, que se desenvolve na corrida para descobrir os piores entre os maus, os vilões da história que nos trouxe aqui. Estamos na Terra do Nunca. Mas faltam-nos os sonhos."

in Notícias Magazine, por Catarina Carvalho
(Directora Executiva)

Sem comentários:

Enviar um comentário